«(...) As culturas primitivas criaram um sistema de metáforas e de símbolos que, como mostrou Lévi-Strauss, constituem um verdadeiro código de símbolos ao mesmo tempo sensíveis e intelectuais: uma linguagem. A função da linguagem é significar e comunicar os significados, mas nós, homens modernos, reduzimos o signo à mera significação intelectual e a comunicação à transmissão de informação. Esquecemos que os signos são coisas sensíveis e que operam sobre os sentidos. O perfume transmite uma informação que é inseparável da sensação. O mesmo sucede com o sabor, o som e as outras expressões e impressões sensoriais. O rigor da "lógica sensível" dos primitivos nos fascina por sua precisão intelectual; não é menos extraordinária a riqueza das percepções; onde um nariz moderno não distingue senão um cheiro vago, um selvagem percebe uma gama definida de aromas. O mais assombroso é o método, a maneira de associar todos esses signos até tecer com eles séries de objectos simbólicos: o mundo convertido numa linguagem sensível. Dupla maravilha: falar com o corpo e converter a linguagem num corpo.
(...)
... a arte é o equivalente moderno, do rito e da festa: o poeta e o romancista constroem objectos simbólicos, organismos que emitem imagens. Fazem o que faz o selvagem: convertem a linguagem em corpo. As palavras já não são coisas, e sem deixar de ser signos, se animam, ganham corpo. O músico também cria linguagens corporais, geometrias sensíveis. Ao contrário do poeta e do músico, o pintor e o escultor fazem do corpo uma linguagem. (...)»