"Cork: Forest in a Bottle"
IMPORTANTÍSSIMO: Documentário da BBC na defesa da cortiça portuguesa e preservação de ecossistema único no mundo
IMPORTANTÍSSIMO: Documentário da BBC na defesa da cortiça portuguesa e preservação de ecossistema único no mundo
Excertos do documentário (em transcrição para texto):
A região do Alentejo no Sul de Portugal, estende-se de Lisboa a Ocidente até aos montes da fronteira espanhola a Oriente. São cerca de 26 mil quilómetros quadrados, o tamanho do País de Gales. E é a região do cultivo de cortiça mais importante do mundo. Estas zonas arborizadas, de sobreiros perenes e dos seus parentes próximos, as azinheiras, são conhecidas em Portugal como montados. Embora o montado seja muito bom para a vida animal, não é um terreno em estado selvagem, mas ecossistema natural de zonas arborizadas e pastos, harmoniosamente adaptado a uma agricultura sustentável ao longo de mais de 1000 anos. Os terrenos por baixo das árvores servem normalmente de pasto, embora onde haja terra de melhor qualidade, os proprietários cultivem normalmente citrinos, vinhas e oliveiras. Isso deu origem a um mosaico rico de habitat tão benéfico paraa vida selvagem como para os agricultores.Cortiça: A escolha (Eco)Lógica - Cork: The (Eco)Logical choice
(...) Francisco Garrett é um agricultor cuja família gere uma vasta área de floresta de forma tradicional há muitas gerações. Além de possuir um conhecimento profundo do seu próprio sobral, Francisco defende apaixonadamente, a sobrevivência do montado português e da sua espectacular vida selvagem. (...)
Embora os gregos e romanos antigos soubessem o valor da cortiça, só começou a ser extraída para fins comerciais em Portugal há cerca de 300 anos. A extracção ainda é feita por grupos de homens com machados e está por inventar um método mecânico viável que execute a tarefa mais eficazmente.
- O importante é saber a força que é preciso aplicar, para não danificar a camada viva da casca. Estes machados são fabricados a nível local, em várias povoações e há machados maiores e mais pequenos. São muito úteis e característicos de Portugal.
O descortiçamento só se faz no meio do Verão quando a casca descola do tecido vivo mais facilmente.
- Os cheiros da cortiça acabada de extrair são fantásticos.
O saber necessário para colher a cortiça é muitas vezes transmitido de pai para filho.
- É preciso saber bem o que se faz para subir às árvores e trabalhar com um machado no ar.
- Um aspecto muito importante é ser sustentável, porque a cada 9 anos extrai-se a cortiça e a árvore não morre. Quanto mais se extrai melhor é a cortiça.
Que árvore extraordinária. Os sobreiros são as únicas árvores das quais é possível extrair um pedaço inteiro de casca assim sem as matar.
Uma árvore deste tamanho produz casca suficiente para 4000 rolhas. E esta tiragem dá emprego a pelo menos 60 mil trabalhadores portugueses.
Cada árvore é marcada com um número para assinalar o ano da tiragem. A marca permanecerá visível, já que a casca engrossa de dentro para fora, lembrando aos proprietários que a próxima tiragem deverá ser em 2016.
(...)
Se houver sobreiros e azinheiras a crescer lado a lado, as «águias calçadas» preferem sempre o sobreiro à azinheira para nidificar. Talvez a casca rugosa segure melhor os galhos. (...) Chamam-se águias calçadas por causa da quantidade de plumagem nas patas. Ambos os adultos constroem o ninho forrando muitas vezes com folhas de sobreiro. Os ninhos bem sucedidos são reutilizados no futuro e embora ponham normalmente dois ovos, só uma cria costuma emplumar, porque o fratricídio é habitual. O macho cuidadoso, captura inúmeras aves e pequenos mamíferos no intervalo da actividade da tiragem.
Durante o mês de Agosto, a tiragem anual de cortiça chega ao fim e actividade no montado abranda gradualmente com a aproximação do Outono,
No fim de Outubro os sobreiros descortiçados ficam de um vermelho intenso, à medida que a casca torna a crescer.
Os sobreiros fornecem agora outra colheita abundante e as grandes bolotas têm valor nutritivo especialmente para os porcos.
- Uma das espécies mais importantes do universo do montado e do sobreiro é o porco preto alentejano. É a partir da sua carne que é fabricado o presunto.
As bolotas dão ao presunto um sabor único a noz e os porcos devoram-nas de Novembro até Fevereiro.
- A carne deste porco é muito apreciada e é uma das fontes de rendimento anuais do montado, porque só se obtém cortiça a cada 9 anos.
Em prados intactos, as marcas de passagem à superfície revelam um mamífero mais pequeno e discreto à caça de bolotas, é um rato que só existe em Espanha e Portugal e prefere o sobral. Irá regressar à dieta habitual de erva quando já não houver bolotas.
O Inverno não ser muito frio nesta zona de Portugal, os sobreiros não crescem de Novembro em diante. O Inverno proporciona a Francisco mais tempo para dar aos seus milhares de sobreiros a atenção de que precisam para se manterem saudáveis e continuarem a produzir casca e bolotas de alta qualidade.
- Estas árvores já foram podadas várias vezes. Quando se começa a podá-las é preciso continuar. É como quando um homem interfere na natureza, depois de começar, tem de continuar a fazê-lo para dar equilíbrio à árvore. Convém que tenha tanta área de folhagem como de raiz, consoante a idade da árvore. A poda é essencial nas árvores jovens, para que tenham uma casca direita, pelo menos com dois, três metros de altura, sem ramos e dêem boa cortiça para as rolhas.
Quando chega o fim do ano, a casca de cortiça dos sobrais circundantes enche quase por completo os armazéns. Este produto natural e sustentável serve agora de sustento para os que trabalham nas fábricas.
O Inverno, também traz ao montado, visitantes do exterior ... Migram todos os anos da Escandinávia para tirar proveito da abundância de bolotas. Os seus chamamentos são uns dos sons mais evocativos do Inverno no montado.
(...)
Sendo o destino de Inverno de quase trinta outras espécies migratórias do norte da Europa, o montado português está a tornar-se cada vez mais importante. (…)
Contudo só nos últimos 20 anos a grande diversidade de vida vegetal e animal tem sido estudada a fundo. Tiago Marques e Ana Rainho são especialistas em morcegos. As grutas e antigas minas são tradicionalmente usadas pelos morcegos no Alentejo para hibernar durante o Inverno. Ana e Tiago estão a estudar as populações antes que os morcegos dispersem para procriar. São morcegos-ratos gigantes. Apenas uma das 26 espécies que se encontram nesta região de Portugal (…)
- Esta espécie chama-se morcego-de-peluche, apesar do tamanho reduzido do corpo, têm asas grandes e esguias. Para as manterem dobradas, dobram a extremidade da asa… Eles dobram as asas.
As asas compridas são perfeitas para voos rápidos entre os sobreiros em busca de insectos e graças há pouca utilização de pesticidas, não faltam insectos no montado, tanto para os morcegos como para as aves como o pica-pau malhado pequeno.
No início de Março, aves como as poupas (…)
Contrariamente ao que acontece em boa parte da Europa, quase não há descargas de químicos nas terras em redor. Por isso as chuvas primaveris, enchem os ribeiros e lagos de água limpa…
(…)
- Há um provérbio português que diz: vinhas das minhas, olivais de meus pais, montados dos meus antepassados. Isso demonstra o tempo que leva a estabelecer um montado.
(…)
– Uma característica especial do medronheiro é o facto das suas folhas serem a fonte de alimento de uma lagarta muito específica, a da borboleta do medronheiro. Só se alimentam destas folhas, por isso, ao manter estas plantas, ajudamos a natureza.
Ao compreender a vida selvagem e ao gerir o montado de uma forma amiga do ambiente, Francisco ajuda à sobrevivência da cada vez mais rara borboleta do medronheiro.
- Ao caminhar por aqui, o que faço aos fins-de-semana, uma das coisas que encontrei foi o ninho de um noitibó. São muito abundantes aqui e muito difíceis de encontrar, porque se confundem com a paisagem.
(…)
A cegonha preta. As áreas arborizadas mais remotas para produção de cortiça perto da fronteira espanhola constituem um porto de abrigo europeu vital para estas aves impressionantes e enigmáticas. Estamos agora em Maio e este macho acabado de regressar de África procura uma fêmea para acasalar. Ela está mais abaixo em busca de um potencial local de nidificação nos sobreiros. Por isso ele tem de atrair à atenção dela. Fá-lo voando em círculos com as longas patas compridas apontadas na direcção dela. Mas o clímax dá-se quando ergue a cabeça para produzir um chamamento especial. Se ficar impressionada a fêmea juntar-se-á a ele num ballet aéreo gracioso que se tivermos a sorte de testemunhar, é das visões mais belas do montado. As cegonhas pretas são extremamente raras e agora fortemente protegidas em Portugal. Como preferem nidificar em sobreiros maduros, simbolizam a relação próxima entre a conservação da Natureza e uma indústria de cortiça saudável e bem sucedida.
O futuro do montado e da sua vida selvagem é ditado em boa parte pela economia. Os produtores de cortiça têm de conseguir de vender a tiragem às fábricas por um bom preço. Com a concorrência cerrada da parte de tipos alternativos de vedantes. Os fabricantes modernizaram e apuraram os seus métodos de produção para evitar acusações de que a cortiça pode por vezes estragar o vinho. Hoje em dia as pranchas de cortiça são mergulhadas duas vezes em tanques selados com água a ferver. O que mata o bolor e as bactérias e torna a cortiça mais flexível. Nas fábricas impecavelmente limpas dos dias de hoje, as rolhas são analisadas individualmente para evitar imperfeições. São esterilizadas, polidas e agrupadas em categorias e são escrupulosamente analisadas pelos laboratórios da empresa nas amostras de cada lote …
(…)
Até animais muito tímidos vivem confortavelmente aqui, especialmente nas zonas mais remotas e pouco povoadas. Este pastor pode caminhar vinte quilómetros sem se cruzar com alguém nem ver outros animais a pastar. Excepto talvez uns veados especiais. Podem parecer veados vulgares, mas são uma subespécie diferente que se encontra apenas em Portugal e em Espanha. Enquanto pastam a cena é tranquila , até mesmo idílica. No entanto quando os veados sentem sede, o seu comportamento muda radicalmente… Uma raposa local… Um lince ibérico é com certeza capaz de matar um cria de veado ou até um adulto ferido ou fraco. Dois destes felinos impressionantes foram recentemente encontrados na região do Alentejo. E os biólogos conservacionistas anseiam desesperadamente que este casal procrie com sucesso…
(…) Enquanto os abutres percorrem os céus estão sempre atentos.
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- A principal razão para eu plantar Lupinus (tremoços) no montado é o facto de achar que não pode haver solo despido no montado. As Lupinus são um legume, fixam o nitrogénio no solo e também cobrem o solo no Inverno, evitando a erosão. Podem servir de pasto quando estão secas, às ovelhas ou gado bovino. É muito bom para o solo debaixo do sobreiro.
Plantas assim também ajudam a reter a humidade e a manter as raízes das árvores mais frescas durante o pino do Verão quando as temperaturas podem atingir os 40 graus centígrados ou mais. As Lupinus são flores importadas e não atraem as abelhas como as flores autóctones, por exemplo a lavanda. Com tanta riqueza de flores… (…)
Os abelharucos não são as únicas criaturas da região que apreciam abelhas, o sardão também as apanha…
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Estes belos lagartos em vias de desaparecer prosperam no montado português. São a maior espécie da Europa, chegando a atingir um metro de comprimento. E conseguem comer pequenos roedores. No entanto apesar do tamanho não estão livres de perigo. Durante o mês de Junho uma cegonha preta com crias para alimentar não hesitaria em tentar apanhar um…
(…)
– Vivemos da cortiça, por isso quando chega a altura de a extrair e de a enviar para a fábrica, isso significa que a conseguimos fazer crescer e que não houve percalços durante esses 9 anos e nos 40 anos anteriores. Isso é um feito. É uma recompensa e é o que nos dá alento.
A maior parte desta pilha de cortiça de alta qualidade será transformada em rolhas essenciais para a economia do montado. Ainda por cima os sobreiros absorverão milhões de toneladas de dióxido de carbono da atmosfera todos os anos. Milhares de milhões de rolhas de cortiça de alta qualidade continuam a ser usadas em todo o mundo. Trata-se de um produto biodegradável de baixo consumo de energia que preenche todos os requisitos ambientais. E no entanto está em risco de ser substituído por rolhas sintéticas e tampas de roscas de metal.
Será que o futuro da floresta de cortiça e da sua vida selvagem depende de nós consumidores? Se assim for, o que podemos fazer?
- Uma coisa que devemos fazer é quando vamos ao supermercado e escolhemos um vinho, tentar saber se a rolha da garrafa é de cortiça e cortiça verdadeira. Se for, tenho a certeza de que contribuirá para a sustentabilidade de uma região mediterrânica vasta onde há um grande número de espécies.
O futuro de tanta riqueza natural parece depender de escolhas aparentemente triviais.
- É claro que temos escolha. Podemos escolher preservar um habitat único na região do Mediterrâneo ou não, podemos escolher um produto que é amigo da natureza ou não.